CRM abre 54 processos para apurar conduta de médicos

 

Foto:  Arquivo/Folha
Nilo Brandão, corregedor do CRM: “Estamos aqui para salvaguardar a sociedade do mau médico e proteger o bom profissional”

ANDREZZA TRAJANO

O Conselho Regional de Medicina (CRM) recebeu 65 denúncias no ano passado relacionadas a supostos erros médicos. Dessas, apenas seis viraram Procedimento Ético Profissional (PEP), uma vez que foram detectados indícios de irregularidades no atendimento oferecido ao paciente. Somente dois médicos foram punidos por denúncias apuradas em anos anteriores. 

O corregedor do CRM, Nilo Brandão, explica que parte das denúncias foi enviada a outros órgãos, por se tratar de reclamações feitas sobre a conduta de profissionais de saúde distinta aos médicos, como odontólogos e enfermeiros. 

Foram instauradas 54 sindicâncias, onde 33 foram arquivadas por não apresentarem infração ao Código de Ética Médica. Em pelo menos seis casos os pacientes não se deram por satisfeitos com a extinção da investigação e recorreram ao Conselho Federal de Medicina (CFM), que é uma instância superior. As principais reclamações, diz Brandão, tratam de problemas de relacionamento entre médicos e pacientes. 

Nas 12 sindicâncias restantes, foram feitas seis conciliações entre médicos e pacientes. As outras seis foram transformadas em PEP, já que as sindicâncias concluíram que houve infração ao Código de Ética Médica. Isso quer dizer que há indícios que determinado médico cometeu ilícito, que pode ser negligência, imprudência ou imperícia médica.

Além desses, outros 19 Procedimentos Éticos Profissionais tramitam no Conselho Regional de Medicina referentes a anos anteriores, totalizando 25 investigações em andamento. Todas correm em segredo de justiça. 

Em 2011, dois médicos foram julgados e condenados pela Câmara de Julgamento, onde receberam como punições censuras confidenciais. Como não foram públicas, o corregedor afirma que elas não podem ser divulgadas. As punições são referentes a casos registrados em anos anteriores.

MORTES – A conduta dos médicos roraimenses voltou a ser amplamente debatida, depois que a defensora pública Maria Luiza Coelho, 49, morreu após ser submetida a uma cirurgia estética realizada pelo médico Henrique Schiaveto na semana passada. 

Ela passou por a uma lipoaspiração e a uma cirurgia para sustentação dos seios na quinta-feira passada, 5, e morreu dois dias depois. O atestado de óbito aponta como causa da morte septicemia (infecção generalizada) e lesões viscerais de cirurgia na região torácica e abdominal.

De acordo com Nilo Brandão, o CRM já instaurou sindicância para apurar a morte da defensora. Também está investigando a morte de outra paciente, Maurizia Gomes de Sousa, ocorrida em outubro passado, igualmente após ser submetida a uma cirurgia estética realizada por Schiaveto. 

Schiaveto ainda é o responsável pela cirurgia estética feita recentemente na professora Mauriceia Cunha Pereira, 27. Ela estava internada na Unidade Semi-intensiva do Hospital Geral de Roraima, em razão de complicações decorrentes do procedimento cirúrgico, mas ontem apresentou melhoras e foi levada para um bloco. 

Os casos são investigados na esfera criminal pelo Ministério Público de Roraima e pela Polícia Civil. O Conselho Regional de Medicina assegura que também instaurou sindicância para apurar o atendimento prestado a Mauriceia. 

O médico ainda responde a outro PEP instaurado pelo Conselho Regional de Medicina em 2010, que apura o atendimento prestado a uma paciente. A investigação está em estágio avançado e a previsão é de que o médico seja submetido neste ano ao julgamento ético. 

“As denúncias precisam ser formalizadas. Não adianta o ‘burburinho’, tem que vir aqui [no CRM] e relatar o que aconteceu. Agora que estamos tomando conhecimento dos casos pela imprensa, estamos agindo de ofício”, explicou o corregedor. 

Henrique Schiaveto protocolou junto ao CRM um documento contando parte dos fatos e solicitando seu afastamento da atividade de cirurgião, porque estaria precisando de suporte psicológico. Apesar disso, não há nenhum impedimento legal para que ele desenvolva suas atividades. 

Ele não quis falar com a imprensa, mas segundo uma secretária dele, “está muito abalado e em depressão com o que houve”. Anteontem o médico prestou esclarecimentos ao Ministério Público sobre a morte de Maurizia Gomes de Souza. 

MAIS MORTES – No caso da suposta negligência médica no atendimento prestado às jovens Juslany de Souza Flores, 28, e Érika da Silva Macena, 18, que morreram em maio de 2010 após darem à luz no Hospital Materno Infantil Nossa Senhora de Nazareth, bem como da aposentada Edi Maria Hirt, de 77 anos, que perdeu a vida em abril do ano passado, após ter a perna errada operada no Hospital Geral de Roraima, o corregedor afirma que também foram instaurados PEPs. 

“Em todas essas situações encontramos indícios de infração ao nosso código”, afirmou ele. A previsão é que neste ano os médicos envolvidos nos casos sejam julgados pela Câmara. 

MÉDIA – As 54 sindicâncias instauradas em Roraima no ano passado estão dentro da média, diz o corregedor Nilo Brandão. “Estamos aqui para salvaguardar a sociedade do mau médico e proteger o bom profissional”, destacou. 

Conforme Brandão, “o crescimento no número de denúncias significa que a população está mais esclarecida, exercendo sua cidadania”. O CRM afirma estar de olho na conduta de seus profissionais. Em Roraima existem 500 médicos em atividade. 

Em 45 anos, CRM nunca cassou registro de médico

Desde a existência do Conselho Regional de Medicina, há 45 anos, nenhum médico nunca teve seu registro profissional cassado em Roraima. Mesmo diante de denúncias de supostos erros, que teriam provocado a morte de pacientes, tanto em hospitais públicos como particulares, os procedimentos quando não são arquivados por improcedência, não chegaram à punição máxima.

A maior penalidade aplicada a um médico, segundo informação repassada pelo CRM no ano passado, foi a suspensão por 30 dias da prática do exercício profissional, por “suspeita de aborto provocado”. 

O corregedor Nilo Brandão rechaça a ideia de corporativismo no órgão fiscalizador. “Apreciamos todos os procedimentos. Eu jamais vou pegar uma denúncia e colocar debaixo do tapete, seja contra o presidente ou qualquer outro membro do CRM. Estamos aqui para apurar o que manda a lei”, frisou. 

“Todas as vezes que uma pessoa entra com uma denúncia no CRM, acha que um médico vai ser penalizado. Se tiver uma infração ao código de ética, aí sim ele vai ser penalizado, não somos corporativistas. Se ele cometeu alguma infração ao código, automaticamente vai sofrer sanção”, enfatizou.

DENÚNCIA – O paciente ou um ente familiar, além do advogado, podem formalizar denúncia na entidade referente a procedimento médico. Em caso de comoção social, o próprio órgão pode instaurar uma sindicância contra o profissional.

A partir daí é instalada a sindicância. Ela é preliminar ao Processo Ético Profissional.  Dela é possível saber se houve ou não alguma infração ética do médico. Nomeado, o sindicante tem 30 dias para formular o relatório. Posteriormente o documento passa pela Corregedoria e pela Câmara de Julgamento, composta por oito conselheiros, para decidir se vota ou não o relatório.

Se for apontada a infração médica, é instaurado o PEP. O processo corre em segredo de justiça, com prazos a cumprir e outros trâmites burocráticos, até chegar ao julgamento do médico. O procedimento pode durar até um ano para que seja concluído.

O profissional pode sofrer diversas punições, desde a censura pública até a cassação do exercício profissional, referendado pelo Conselho Federal de Medicina (CFM). Todas as punições ficam registradas na ficha do médico.

Caso o paciente não fique satisfeito com a decisão do CRM, existe grau de recurso, onde ele pode recorrer ao CFM. O Conselho Federal abre um novo processo, emite um relatório e verifica se aquele julgamento que ocorreu no âmbito regional é verdadeiro ou não.

Sindicantes podem pedir interdição cautelar de médico, afirma CRM


Presidente do CRM, Wirlande da Luz

O presidente do Conselho Regional de Medicina, Wirlande da Luz, disse à Folha que qualquer um dos três titulares das sindicâncias abertas recentemente pode pedir a interdição cautelar do médico Henrique Schiaveto de suas atividades profissionais. Contudo, precisa ser apreciada pela Câmara de Julgamento.

Esse instrumento criado em 2008 pelo Conselho Federal de Medicina permite suspender pelo prazo de um ano a atividade do médico até a conclusão do Procedimento Ético Profissional. Embora Schiaveto tenha entregue ao CRM uma carta pedindo seu afastamento do exercício de cirurgião, a legislação consente que ele continue operando. 

Wirlande da Luz afirma que o órgão já pediu cópias dos prontuários médicos aos hospitais para instruir os procedimentos, mas que até agora não recebeu. A interdição cautelar só pode ser solicitada se existirem contra o médico pelo menos duas denúncias de supostas irregularidades no exercício da profissão. Schiaveto responde atualmente a pelo menos quatro procedimentos. 

“Agora já cabe legalmente a interdição cautelar. Se vai ser pedida ou não só depende do instrutor do processo”, informou o presidente do CRM.

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