ANA KARINE OLIVEIRA

Por falta de condições mínimas para atendimento de qualidade e atraso de salários, que já dura dois meses, médicos, enfermeiros, técnicos, fisioterapeutas e pessoal de apoio decidiram suspender as atividades no Hospital da Criança Santo Antonio (HCSA), na manhã de ontem. O retorno aos trabalhos depende de uma solução urgente para a situação caótica apresentada na unidade hospitalar.

“Falta simplesmente tudo. Medicamentos básicos e antibióticos não existem aqui para as crianças serem tratadas devidamente. Nos  recusamos a realizar atendimento por não haver como proceder do mais simples caso que apareça ao mais grave. Nem luva para qualquer procedimento médico temos”, salientou a médica pediatra Norma Távora.

A falta de medicamento é apenas um dos problemas citados, pois a lista de reclamações é bem extensa. Segundo os funcionários, não há mais alimentação para ser oferecida aos pacientes, acompanhantes e servidores plantonistas. “Estão nos liberando para que possamos nos virar e comprar nossa alimentação. E quanto aos pacientes, os pais têm que providenciar o da criança e os deles mesmos. É importante frisar que, para fazer qualquer medicação ou atendimento, explicamos aos pais que devem comprar o necessário, como esparadrapo, luvas, gases, caso contrário não há possibilidade de realizar o serviço”, destacou o enfermeiro Ricardo Fonseca mencionado ainda que o aparelho de Raios X não está funcionando pela falta do dosímetro, conforme já denunciou a Folha.

Sobre a alimentação, os denunciantes informaram que estão sobrevivendo de doações advindas de repartições públicas, o que na maioria das vezes é insuficiente. “Na semana passada, tínhamos apenas arroz e farinha. Todos que estavam aqui tiveram de comer isso. Hoje [ontem] acabou tudo. O único macarrão que tinha foi feito e sem tempero. Estamos sem servir água porque nem copos descartáveis existem mais. A situação é revoltante e precisa-se o mais rápido possível de uma atitude do poder público”, disse a cozinheira do hospital, Rosa Maria.

Com relação à manutenção, um servidor que pediu para não ser identificado, contou que 60% das centrais de ar estão quebradas e o hospital praticamente às escuras, havendo sempre a necessidade de tirar lâmpadas de um lugar para outro. 

A bomba de vácuo, usada para sugar secreções, e o ar comprimindo, para nebulizações estão em péssimas condições. “Sem veículos, sem peças de reposição, o grupo gerador de energia está prestes a entrar em pane, ocasionando sérios problemas. Isso tudo é resultado de uma administração despreocupada com a sociedade, pois só quem está passando por esse caos entende a nossa revolta”, acrescentou.

Outro motivo da suspensão das atividades é o atraso de salários referente aos meses de outubro e novembro. Os servidores foram informados que não há previsão para recebimento do salário referente ao mês de dezembro. “Ficou acordado em documento que até hoje [ontem] sairia o pagamento. Mas não ocorreu. Não dá mais para trabalhar sem receber. Temos famílias que sustentamos e contas a pagar. Nem dinheiro para combustível temos mais”, frisou a fisioterapeuta Mônica Medeiros, ressaltando que todos voltariam ao trabalho somente após receberem os pagamentos devidos e com condições necessárias para realizar atendimento.

SMSA – Conforme nota enviada pela assessoria de comunicação da Prefeitura de Boa Vista, a Secretaria Municipal de Saúde (SMSA) está tomando todas as providências necessárias para que medidas sejam adotadas no sentido de garantir o bom funcionamento do Hospital da Criança Santo Antônio.

“O Município respeita o direito de manifestação do funcionalismo, mas alerta que a legislação determina que os profissionais devem manter no mínimo 30% do pessoal trabalhando. Há um revezamento de equipes para os serviços não serem interrompidos”, destaca a nota.

Crianças doentes estão voltando

Muitas pessoas que foram buscar atendimento no Hospital da Criança foram pegas de surpresa com a paralisação ontem.  A doméstica Mara Ivanilde, 38, mora no Município de Mucajaí e veio até Boa Vista na expectativa de que seu filho fosse atendido. “Não sei o que vou fazer. O único lugar no Estado de prontoatendimento às nossas crianças está parado, resta apenas voltar para casa até que isso se resolva”, disse.

Outra mãe de paciente, Rafaela Silva, 26, contou que seu filho está com problemas respiratórios muito sérios precisando de atendimento emergencial,  mas afirmou que arranjaria outros meios de consultá-lo em clínica particular.

O Hospital da Criança é a única unidade médica do Estado especializada no atendimento infantil. No local são oferecidos os serviços de urgência, emergência ambulatorial e internação. 

Segundo o presidente do Conselho Regional de Medicina-CRM, Wirlande Luz, na semana passada um ofício foi encaminhado ao órgão pelo diretor clínico da unidade de saúde que tratava da iminência de o hospital fechar por conta dos problemas enfrentados há mais de seis meses.

Ele explicou que o hospital não pode fechar, uma vez que atende crianças de todo o Estado e ainda das cidades fronteiriças da Venezuela e da Guiana. “O hospital atualmente está com cerca de 80 pacientes internados em leitos, fora as que ficam em cadeiras aguardando a liberação de leitos. Trata-se de uma questão que necessita urgência em soluções por meio da união dos poderes públicos, principalmente da Prefeitura, pois a unidade é de responsabilidade do Município”, destacou. 

Autoridades prometem se unir para solucionar os problemas 



Representantes do Governo do Estado e da Prefeitura de Boa Vista durante reunião

Assim que os funcionários do Hospital da Criança Santo Antonio (HCSA) cruzaram os braços diante da situação precária da unidade, uma reunião foi convocada para uma possível solução imediata aos problemas enfrentados.

Na ocasião, estiveram presentes a diretora do hospital, Claudete Praia, o governador em exercício Chico Rodrigues, o presidente do Conselho Regional de Medicina-CRM, Wirlande da Luz, e o secretário estadual de Saúde, Leocádio Vasconcelos.

“Estamos vivendo hoje um quadro de desabastecimento parcial, principalmente de gêneros alimentícios e medicamentos como antibióticos. Só temos um elenco de medicação básica no hospital, e outro caso grave é a falta de pagamento dos servidores que ocasiona um grande descontentamento da equipe, o que agrava mais os problemas”, ressaltou a diretora do hospital. 

Segundo ela, por questão de a saúde ser tripartite, isto é, de interesse da União, Estado e Município, toda a discussão tratada na reunião faz parte de uma estratégia em que estes elementos devem unir-se em prol de achar meios para conseguir resultados positivos, pondo fim aos transtornos, em até 72h, quando deve acontecer a completa regularização do pagamento dos servidores e o reabastecimento do Hospital da Criança.

Apesar de o problema ser de responsabilidade do Município, o Estado dará apoio para a solução do caos. Conforme Leocádio Vasconcelos, ficou acordado na assembleia que a equipe técnica do HCSA vai fazer um levantamento de todas as necessidades materiais do hospital, em todos os âmbitos: alimentação, higiene, limpeza, médico-hospitalar e medicamentos, ou seja, das necessidades que precisam ser supridas, até final de janeiro de 2013, por meio de recursos enviados pelo Ministério da Saúde (MS). 

“Sentaremos com o prefeito e órgãos de controle para que possamos adquirir os materiais, em caráter extraordinário, a ser pago com recursos que o Ministério da Saúde já assegurou e está repassando. Lembrando que todo o valor está sendo repassado ao Fundo de Participação Municipal, e não ao Estado”, explicou Vasconcelos.

O Ministério da Saúde liberou especialmente para o custeio do Hospital da Criança o recurso de R$ 4,5 milhões, divididos em três parcelas. A primeira parcela foi paga esta semana. “A princípio, é importante lembrar que o recurso não poderia ser usado para pagar o pessoal, mas ainda será discutida essa questão”, disse o secretário.

Sabe-se que a demanda de crianças é muito grande e o Estado ficaria sobrecarregado nos atendimentos. O governador em exercício Chico Rodrigues explicou que, por solicitação do CRM e dos sindicatos dos médicos, o Governo vai intermediar  junto à Prefeitura de Boa Vista  uma forma eficiente que possa melhorar as condições atuais do hospital infantil. Nesse momento, os poderes públicos, em qualquer esfera, deverão unir-se no sentido de prestarem serviços de qualidade a toda população infantil.

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